Entendimento da Corte não impede que o fisco responsabilize terceiros pela dívida de uma empresa, mas pode elevar o interesse de autoridades numa forma melhor para cobrar dívidas.
O Superior Tribunal de Justiça (STJ) declarou inconstitucional um decreto que permitia a responsabilização solidária dos sócios de empresa ou associação em caso de inadimplemento da pessoa jurídica nos impostos federais.
Segundo o especialista em direito tributário do Schneider, Pugliese, Advogados, Flávio Carvalho, a decisão aumentou a segurança jurídica. “Em um País como o nosso, em que é tão difícil empreender, [a decisão] dá segurança para o empresário de que ele não ficará com a corda no pescoço quando a empresa não pagar imposto”, afirma.
O Decreto-lei 1.736/1979 determina que acionistas controladores, diretores, gerentes ou representantes de pessoas jurídicas de direito privado são solidariamente responsáveis em caso de falta de recolhimento do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) e no Imposto de Renda descontado na fonte.
Os membros da Corte Especial no STJ, por unanimidade, seguiram o voto do relator, ministro Og Fernandes na questão, relacionada à execução fiscal de uma cooperativa do setor de saúde. De acordo com o magistrado, tanto a Constituição de 1967/1969 quanto a atual, promulgada em 1988, exigem Lei Complementar para alterar normas gerais em matéria tributária. Dessa forma, o decreto expedido na época da ditadura militar – e usado como justificativa pela Receita para fazer a cobrança – foi considerado inconstitucional.
Para o advogado tributarista do Nelson Wilians e Advogados Associados, Adam Henrique Pinheiro da Silva, apesar dos ministros terem analisado o tema pela questão formal constitucional, o decreto já era polêmico desde o início por permitir a responsabilização sem qualquer comprovação de dolo por parte do sócio ou do acionista. “Essa previsão também não está de acordo com os artigos 134 e 135 do Código Tributário Nacional, que afastam a possibilidade da inadimplência gerar, por si só, a responsabilidade solidária”.
“Segundo o decreto de 1979, a mera participação na sociedade já permitiria que os sócios fossem responsabilizados por uma dívida tributária”, ressalta Flávio Carvalho.
Na opinião do advogado do Schneider, Pugliese, é importante que se aponte quem causou o inadimplemento, com uma investigação individualizada. “Em caso de fraude, faz sentido responsabilizar todo mundo, mas obrigar uma pessoa física a pagar por um tributo devido pela empresa sem ter qualquer comprovação de culpa dessa pessoa é algo no mínimo controverso”.
Via mais fácil
Adam Henrique Pinheiro da Silva acredita que a decisão do STJ fará com que a Receita Federal fique mais receosa antes de cobrar dívidas tributárias de sócios das empresas quando não conseguir receber o pagamento da empresa. “As fazendas públicas não analisam qual foi o sócio que atuou com dolo ou acabou fazendo alguma infração. Todos os sócios são inseridos indiscriminadamente e às vezes sem sequer ter direito a defesa em âmbito administrativo”, explica o advogado do Nelson Wilians.
Já Flávio Carvalho lembra que o entendimento da Corte não impede que o fisco responsabilize terceiros pela dívida de uma pessoa jurídica, já que existem outras ferramentas para isso. “A Receita usava a ferramenta mais fácil que tinha à mão, que era responsabilizar sócio e administrador sem provar o envolvimento de cada um”, comenta. “Porém, existem outros mecanismos na execução fiscal que permitem essa busca por responsáveis.”
De acordo com ele, a Procuradoria da Fazenda Nacional regularmente faz esse tipo de execução fiscal, colocando os sócios no polo passivo, de modo que a decisão será muito positiva para os empresários.
Além disso, Carvalho defende que o juízo traz maior harmonia à jurisprudência, visto que tanto o STJ quanto o Supremo Tribunal Federal (STF) já tinham decidido em outros casos que o inadimplemento não pode gerar responsabilidade solidária do sócio-gerente sem que seja apontada qualquer fraude. A Súmula 430, do próprio STJ, versa sobre isso.
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